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Sobre lobos, leões, ursos e homens



A política baseia-se na indiferença da maioria dos interessados, sem a qual não há política possível.  Paul Valéry

Houve um tempo, em que num mundo animal, após séculos sob o despotismo dos ursos e leões, que governavam os quatro ventos com garras e rugidos, um grupo de animais, através de muita luta e sacrifícios instauraram uma democracia, posteriormente escolhendo seus chefes através de eleições livres.

Anteriormente, o sistema autoritário preponderava, pois, devido o baixo conteúdo cognitivo da maioria das criaturas, os ursos e os leões revezavam-se na manipulação de suas mentes e uso da força, para obter respaldo para suas ingerências e despotismos. Desde o dia em que os ursos e os leões foram derrubados, as criaturas reuniram-se dentro de seus espécimes fundando suas agremiações políticas em conformidade com suas índoles naturais.

As raposas tinham como base em suas investidas a retórica e a astúcia. Os asnos suas indiscutíveis incapacidades reprodutivas de idéias, o que lhes outorgou a continuidade de suas características vilipendiosas. As ovelhas como sempre, optaram por continuarem a serem conduzidas, sem se importar de quem se tratava o pastor. As vacas alheias a tudo, continuaram a andar e a estercar. Os ursos decidiram continuar com seus abraços mortais naqueles que ousassem atravessar seus caminhos. Os papagaios juraram sempre contar tudo, mesmo o que fosse caso de segredo de Estado. As aves de rapina em seus acordos decidiram só assaltar os incautos, quando não houvesse testemunhas por perto e os leões mesmo sem o trono não se permitiam perder a pose.

Os lobos tornaram-se com o tempo os mais radicais entre todos os animais. Destemidos enfrentavam nos discursos e às vezes até mesmo partiam para o ataque contra os leões e ursos. Apesar de truculentos chegaram ao poder após muito tempo de mentiras e ameaças que conquistaram a grande maioria que era de ovelhas e vacas, que pouco se importavam com os acontecimentos, pois só pensavam em pastagens e sombra para ruminar tranquilamente.

O primeiro passo dos lobos foi à criação de uma associação, que tinha como bandeira primaz à luta por uma melhor vida aos asnos, vacas e ovelhas, aos quais prometiam pastagens férteis e suculentas totalmente sem ônus e impostos, as quais pertenciam aos leões e ursos, que movimentavam a economia daquele mundo animal. Enfim, foi prometida vida boa e regalada com muita comida e diminuição das horas de adubação e manutenção dos campos; únicas atividades acessíveis a essas espécies.

A esperança da maioria se acendeu com a assunção do maior posto do daquele mundo animal por um lobo felpudo. No comando os lobos trataram logo de buscar estratagemas para livrarem-se, silenciarem ou imobilizarem os ursos e leões, como também manter sob controle a euforia daquela maioria. A primeira solução foi comprar as raposas, barganhando apoio político por lã, que vergonhosamente era tirada das ovelhas enquanto dormiam e quando os ovinos reclamavam à falta, a matilha atribuía a responsabilidade aos leões e ursos, dizendo: agora os leões e ursos não podendo obrigá-las a doar a lã estão a roubá-las. E as ingênuas lanzudas acreditavam…

As aves de rapina foram conquistadas por presas imobilizadas, o que lhes evitou arriscar-se a caçá-las às claras na rua. Aos papagaios foram dados cargos de confiança nos bastidores do poder, desde que ficassem calados e eles prontamente rasgaram seus juramentos aceitando a barganha. A audácia dos lobos foi tanta, a ponto de conseguir apoio político de alguns leões em troca de quem diria: ovelhas para o café, almoço e janta do rei dos animais. Para alguns ursos em troca do apoio foram dados potes enormes de mel roubados das abelhas, os animais que mais trabalhavam naquele mundo. E assim os lobos conquistaram sua estabilidade no poder.

Nos períodos políticos, os animais cada um em sua agremiação política envolviam-se em discussões, pancadarias, mas, após as eleições os mesmos que se digladiaram nas campanhas dividiam o mesmo palanque de mãos dadas em troca de favores, que não beneficiavam em momento algum os demais animais que haviam votado neles, e sim suas flâmulas partidárias. E assim, naquele mundo animal todos viveram felizes para sempre, as ovelhas, vacas e os asnos pastando e estercando os jardins onde os lobos juntamente com as raposas, leões e ursos esquentavam-se sob os raios do sol…


 
 
 

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