1984, O filme
- Davi Roballo
- 29 de mar. de 2010
- 5 min de leitura
Baseado no bestseller 1984 de George Orwell escrito em 1948, trata de uma sátira aos sistemas políticos totalitários instituídos na época em que foi escrito. O autor dividiu ficticiamente o mundo em três grandes Estados: Eurásia, Lestásia e Oceania. O enredo focaliza a Oceania, um Estado totalitário que subjuga seus habitantes através da manipulação das informações e dividindo-os em membros internos e externos do Partido e proletariado, mantendo-os permanentemente vigiados por teletelas, controlados pelo Grande Irmão(Big brother).
No decurso do filme, são reveladas todas as artimanhas de um Estado totalitário como realmente são. As falsas idéias de realidade, que os lideres do Partido enxertam na mente do povo de Oceania. Idéias capazes de desprezar a natureza e os valores naturais, como os direitos básicos e o prazer. O Partido constitui-se num parasita dos homens comuns, constituindo-se numa minoria privilegiada, sugando e invertendo a mente e a vida daqueles que, iludidos pela manipulação da informação fecham os olhos para a realidade onde o passado e o futuro são sequestrados.
Logo no inicio do filme numa manifestação em que o protagonista (Wisnton) chama de “Dois minutos de ódio”, os membros do partido com os punhos cruzados acima da cabeça em formato de “V” (símbolo do partido), passam a mensagem de que o trabalho pelas mãos está acima do pensamento. No entanto, nota-se que somente os membros externos do partido (vestidos de azul) realizam tal ato.
Nesta mesma imagem percebe-se também que nesses dois minutos manifesta-se uma catarse coletiva, -muito comum em determinados templos religiosos- em que os manifestantes atingem-na no momento de euforia ao insultarem os inimigos do partido, descarregando ali, naquele momento suas tensões. Esta cena leva-nos a refletir sobre que, muitas vezes, o entusiasmo sem questionamento e/ou análise, nos cega em prol de alguns mais espertos.
Em Oceania existe um grande racionamento, tanto de utensílios como uma lamina de barbear, quanto produtos de primeira necessidade, como pó de café, açúcar e carvão, que nas mãos dos dirigentes do partido passam a ser artigos de luxo desfrutados pela cúpula. No entanto, o Partido suprime a falta na mente dos habitantes de Oceania através de muita propaganda institucional manipulada. As informações são tão difundidas repetidamente pelas teletelas, rádio e cartazes que cria uma relação intrínseca entre os cidadãos e o Estado. E essa relação é tão forte que os fazem negar o mundo extrínseco e a delatar os que infringem os códigos do Partido, não importando se são familiares, amigos ou vizinhos.
O cenário cinzento passa-nos a realidade do medo e da depressão inconscientes em que vivem os habitantes de Oceania. Passa-nos também, que vivem numa passividade, com uma falta de interesse e apatia pelo que ocorre ao redor de suas vidas, o que lhes faz permanecerem à margem do Estado, o que não lhes permite criar e/ou buscar possibilidades que os tirem do ostracismo social, ou seja, o Partido através da propaganda institucional maciça adoeceu o povo de Oceania.
O filme de uma forma critica traz a tona a necessidade de construir e cultuar os heróis, como forma de colocá-los nos altares das ideologias como exemplos a serem seguidos. Alimentando assim nos cidadãos comuns a lealdade e a doação de si em prol do Partido, vislumbrando a possibilidade de um dia tornarem-se também heróis.
A guerra inicialmente ocorre contra a Eurásia e posteriormente a Lestásia deixa de ser aliada e passa a também ser inimiga. Parece que sobre a guerra a intenção do autor é mostrar os pactos políticos que existiram e existem em prol da manutenção do poder. Como ocorreu entre a Alemanha e a Rússia no famoso “Pacto de não agressão” entre Hitler e Stalin no inicio da II Guerra mundial e a inversão ocorrida em meados da mesma. “A guerra não é para ser vencida, mas sim continua”. O objetivo da guerra não é a vitória sobre a eurásia ou Eustásia, mas manter a própria estrutura da sociedade intacta”. Conforme lê Winston no Duplipensar.
Por isso a guerra é permanente em Oceania. Quando acaba uma, uma outra tem de ser criada, pois, ela serve para alimentar o ódio pelo inimigo e pelos traidores que, num momento quase conquistam Oceania com fins de acabar com o Partido, mas são rechaçados de forma triunfante. E assim a guerra cíclica continua na utópica Oceania, pois para sobreviver o Partido precisa de novas situações e ameaças. Uma guerra terminada gera um pós-guerra e com isso é construída uma história e em Oceania o passado e futuro não existem, portanto a guerra deve de ser eterna.
Como forma de controlar a informação o Partido cria em Oceania uma língua, a “Novilíngua”, com objetivo de diminuir o repertório de seus habitantes, impossibilitando a construção de opiniões contrárias ao regime. O dicionário já estava na 10ª edição, sinal de que estava com o tempo adaptando-se aos objetivos do Partido, suprimindo cada vez mais o dialeto antigo e considerando as palavras inexistentes nele, como “não-palavras”. Com isso, a incidência de “crimidéia” estaria sobre controle.
As teletelas estavam conectadas 24 horas ao Grande Irmão. Era por elas que se difundiam as informações manipuladas através de noticiários relatando em números o crescimento econômico, queda de mortalidade e diminuição de doenças. Propagandas que passavam a falsa imagem de que o governa era de “todos para todos” e trabalhava em favor do povo.
Desligar a teletela era permitido somente aos dirigentes, numa insinuação de que os lideres do partido não precisavam estar monitorados 24 horas, muito menos precisavam ouvir as notícias construídas, pois, estavam acima dos demais habitantes de Oceania, cabendo a eles a manutenção da cadeia hierárquica.
No filme a verdade pertence ao Partido, que através da propaganda e da manipulação das informações controla a memória dos habitantes de Oceania. A eles só é permitido o amor ao Grande Irmão.Sendo a liberdade de pensamento uma ameaça ao sistema, a meta principal do Partido é tornar o homem o mais desgraçado possível, daí a ideia do “crime do pensamento” e da culpabilidade, base fundamental para criar
uma legião de castrados de pensamento, consolidando de vez o poder como coloca O’brien “Poder é deteriorar a mente. Não é um modo, mas um fim”. O temor dos castigos do Quarto 101, prometidos para os que se insurgem contra os códigos do Partido, impede que alguém sequer duvide do que o mesmo lhe incute na mente como verdade. Tanto que O’brien explica para Winston o que a realidade significa para o Partido, enquanto o tortura: “Nem o passado, nem o presente, nem o futuro existem por si sós, Winston. A realidade está na mente humana, não na mente do individuo que comete erros e logo morre, mas na mente do Partido que é coletiva e imortal”.
Após ser torturado e renegado seu amor por Julia, Winston aceitar amar o Grande Irmão, dizendo-se curado. Ficou como queria O’brien “Não restará lealdade, senão a lealdade ao Partido. Nem amor, senão o amor pelo Big Brother.”
1984, O filme
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