O QUE FICOU DA CHUVA
- Davi Roballo

- 9 de set.
- 2 min de leitura
Ontem choveu pela primeira vez em dois meses. A terra bebeu com a sede de quem espera há muito tempo uma visita que não vem.
Acordei com o cheiro subindo do quintal — aquele perfume que não tem nome, mas que todos conhecem: o cheiro da poeira que se transforma em lama, da grama que desperta.
Na varanda dos fundos, as cadeiras de plástico ainda guardavam poças pequenas onde se refletia o céu cinzento da manhã. Cada uma, um espelho voltado para cima, como se esperasse que a chuva voltasse.
As folhas da bananeira pendiam pesadas, vergadas pelo peso da água que não conseguiam soltar de uma vez. Gotejavam devagar, marcando o tempo com sua música mínima.
Minha mãe costumava dizer que a chuva era o jeito de Deus lavar o mundo. Dizia isso enquanto juntava as roupas do varal, correndo com os braços cheios de pano molhado.
Depois, ficávamos na cozinha, ouvindo o barulho na telha, cada pingo uma nota na sinfonia da tarde. Ela preparava café e eu ficava grudado na janela, vendo os regatos se formarem no quintal de terra.
Agora, caminhando pelas ruas da cidade, vejo nos rostos das pessoas que passam um alívio que não confessam. Como se a chuva tivesse lavado não apenas as calçadas, mas algo dentro deles.
As minhocas saíram da terra encharcada, se arrastando pela calçada numa procissão silenciosa. Lembram-me de velhos que saem de casa depois de longa doença, frágeis, mas determinados a encontrar o sol.
No meio-fio, pequenas poças refletem o céu que já se abre em rasgos azuis. Crianças pulam nelas, fazendo círculos que se expandem como sorrisos na água.
A chuva passou, mas deixou sua marca: nas folhas mais verdes, no ar mais limpo, na sensação de que algo foi renovado sem que ninguém tenha pedido.





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