Olhos de lince
- Davi Roballo
- 5 de fev. de 2008
- 2 min de leitura

Avisto homens acorrentados e vendados nos desfiladeiros escuros da alma, seus pés imersos nos pântanos estúpidos dificultam o caminhar em direção a fenda onde brota a luz.
Acorrentados uns aos outros, sofrem e cansam. Carregam incalculável peso em suas costas. São pedras e similares sem valor, que por estarem impossibilitados da luz pelo tato confundem-nas com joias, por serem lisas e bem torneadas.
Com olhos vendados, pisam em espinhos. Sem visão, desabam em precipícios tenebrosos.
Sotainas e paletós lhes conduzem aos gritos e com um livro em mãos, punem os que se atrevem a retirar o antolho que há sobre os orifícios, espelhos da alma.
Pobres homens! crianças ingênuas, convencidas pelos condutores contumazes, esperam chegar a algum lugar, num insano e lerdo passo em círculos, a volver sempre ao mesmo ponto de partida, por não absorverem a luz, impedida pelas vendas.
Os guias incautos, que os conduzem como ovelhas, também usam vendas sobre os olhos, o que entristece-me, pois eles seriam a salvação a conduzi-los para fora do vale sombrio e boçal, discrepantes dos lindos campos e altivas montanhas que há no livre pensar.
Quantos sábios sábios terão ainda de nascer neste vale obtuso, encarregados de convencê-los a rasgarem as vendas e a caminhar rumo a fenda onde brota a luz. A mesma luz do amanhecer que fecunda a nova criatura e enrijece a velha, para que em cinzas recomponha-se em novo jardim, onde possa cantar os cânticos da liberdade.
Quantos sábios ainda terão para escrever pergaminhos e mais pergaminhos nessa odisseia humana tentando mostrar o esboço que aponta a saída desse vale em forma de labirinto de trevas?
E quantos deles vindouros, ainda terão que enfrentar o escárnio, o exílio, o fogo e a espada, por imposição daqueles que rastejam na mesma altura que o próprio pensamento rasteiro?
Longe ecoa meu lamento em assistir os homens mergulhados no desleixo de si mesmos, conduzidos em matilhas como cães adestrados, a fazer somente o que determinam seus condutores, que há muito barganharam por metal, o mapa das verdadeiras rotas que conduzem ao fulgor.
Dia após dia, vagam eles em busca de nutrientes para suas ilusões, coitados, não há como deixar estender sobre eles meu olhar apiedado.
Oh! Quanta escuridão! Homens que se dizem coloridos, homens desbotados em cores a perderem-se nas vias da vida em falsos corredores.
Oh! Quanto embuste! Mesmo sem enxergar há medo de seus próprios rostos, então se mascaram com véus que não lhes pertencem. Quando sentem a si mesmos, correrem em fuga, com medo dos males que carregam dentro de si, sem admitir.
Oh! Obscuridade maldita! Até quando irá tu guiar esses homens longe da luz, a revolverem na escuridão.
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