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A ILUSÃO DAS EXPECTATIVAS E O AMOR IMPERFEITO

Atualizado: 1 de jul.


Foto: everton-vila-AsahNlC0VhQ-unsplash
Foto: everton-vila-AsahNlC0VhQ-unsplash

 

Amamos não o outro em sua completude, mas as imagens que construímos para preencher vazios internos. Elevamos aqueles que nos cercam a alturas inalcançáveis, lugares onde sua humanidade se perde sob o peso das projeções que lhes impomos. Nesse intervalo entre o real e o ideal, a dor se instala – não porque o outro falhe, mas porque buscamos nele aquilo que não cultivamos em nós mesmos. Cada gesto de amor carrega, implícito, uma expectativa de preenchimento, uma esperança silenciosa de que o outro será o espelho daquilo que negamos em nossa própria incompletude.


Na insistência por encaixar o outro em moldes perfeitos, esquecemos que o amor não se sustenta na ausência das falhas, mas na convivência com elas. O outro, com suas fragilidades e limites, torna-se um espelho que reflete as fissuras internas que evitamos enfrentar. O choque entre a imagem esperada e a realidade exposta não anuncia apenas sofrimento, mas convoca ao reconhecimento: a beleza que reside no imperfeito, nas nuances frágeis do humano que insiste em ser inteiro, mesmo na contradição.


Esse reconhecimento não apaga a dor, mas lhe confere sentido. O amor não é o altar da perfeição, mas o encontro contínuo com as sombras que carregamos, não no outro, mas em nós mesmos. Não se trata de buscar no outro a completude, mas de confrontar a vastidão interna que exige cuidado e presença. Na medida em que nos projetamos no outro para escapar dessa tarefa, repetimos o ciclo da ilusão e da frustração.


Amar o imperfeito e ser amado em nossa imperfeição é a passagem para uma maturidade que não se constrói na fuga, mas na aceitação dos limites. A tentativa de transformar o outro segundo nossos anseios não disfarça senão a resistência ao trabalho de cura que nos compete. O amor que resiste à desilusão nasce justamente quando rompemos com a expectativa da completude e abrimos espaço para uma comunhão entre seres que, embora incompletos, se encontram na aceitação mútua.


O sofrimento que emerge no amor não é um castigo, mas uma exposição das próprias fissuras que nos convidam à compreensão e ao crescimento. Quem amamos, ao nos ferir, revela aquilo que, em nós, ainda não foi integrado. Nessa partilha de vulnerabilidades encontra-se a possibilidade da verdadeira comunhão — não a fusão ilusória, mas o encontro real entre seres fragmentados que se sustentam na presença recíproca.


Não é o amor que fere, mas as expectativas que nascem do medo de encarar as próprias sombras. O desafio não é corrigir o outro, mas acolher a si mesmo na complexidade do humano — um humano sempre incompleto, sempre em transformação, sempre vivendo entre a promessa e a queda. É aí que reside a potência do amor imperfeito, que não promete a perfeição, mas oferece a resistência e o abrigo para que possamos existir em nossa plenitude fragmentada.

 

 

 
 
 

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