A utopia e o sentido da vida
- Davi Roballo
- 24 de mar. de 2010
- 3 min de leitura

Na infância conheci um garoto humilde que a todos dizia “quando eu crescer serei um grande pássaro”, quando perguntado: como? Respondia: “não sei, só sei que serei um grande pássaro” e todos riam dele dizendo que isso era impossível, mas ele continuava a dizer “não sei como, mas vou ser um grande pássaro!”. Há oito anos quando de férias em minha cidade natal, depois de mais de 25 anos sem vê-lo, o reencontrei e fiquei sabendo que hoje ele é piloto de um Airbus da maior empresa de aviação do Brasil.
A vida tem nos mostrado a todo o momento que nossos sonhos e desejos, precisam antes de tudo navegar incansavelmente pelas águas de nossa imaginação para depois se tornarem realidade. Pois tudo precisa de um primeiro passo, de um rascunho, de uma ideia e principalmente de uma vontade. Quando Thomas Morus escreveu Utopia, não imaginou que 500 anos depois parte de do que ele considerava impossível seria uma realidade.
Utopia é um livro escrito em duas partes, a primeira é uma sátira sobre a sociedade da velha Europa do século XVI, e a segunda trata da idealização de uma civilização sem as vicissitudes humanas na qual prevaleceria a fraternidade, a paz e o altruísmo acentuados, ou seja, algo que o autor considerava impossível de ser realizado.
Socialmente não atingimos e nem atingiremos em toda plenitude a segunda parte da Utopia de Morus, mas, o Mundo hoje, tem mais justiça social que na época em que o livro foi escrito.
Segundo Rubem Alves, o sinônimo de utopia é algo inalcançável, no entanto, aponta para algum lugar. O autor na obra “Entre a ciência e a sapiência”, para explicar seu ponto de vista cita Mário Quintana “Se as coisas são inatingíveis.., ora! / Não é motivo para não querê-las… / Que tristes os caminhos, se não fora / A mágica presença das estrelas!.” Para compreendermos o sentido disso, basta imaginarmos os grandes navegadores e seus navios com suas velas infladas pelo vento, antes da invenção da bússola ligando países e continentes orientando-se apenas pelas estrelas. Elas em relação a eles eram inalcançáveis, no entanto, apontavam para uma direção, serviam de referência para que alcançassem seus objetivos.
Vive bem, quem sabe alimentar sua utopia cotidianamente, ou seja, não perde a capacidade de sonhar, imaginar, criar, estar aberto a novas perspectivas, ser absorvido pelo novo, buscando sempre novos mundos, novos caminhos, novos horizontes, pois, segundo o escritor uruguaio Eduardo Galeano “A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”
Etimologicamente utopia é “lugar nenhum”. Mas, discutimos aqui a utopia individual, a que construímos internamente ao rabiscarmos nossas esperanças, sonhos e desejos que muitas das vezes os abandonamos, pois falta-nos a consciência de que o rabisco é algo totalmente diferente da obra e da realização em si.
Muitas vezes desacreditamos de nossos potenciais abandonando-os pela estrada da vida juntamente com todo o fôlego da juventude e o afã primaveril por existir e superar-se. Tudo isso ocorre porque desde a mais tenra infância o homem é condicionado a ser imediatista e a ter tudo ao alcance de suas mãos. Como se não bastasse isso ao deixar de ser criança perde também sua capacidade de imaginar e de projetar-se no tempo e espaço.
Utopia como proveito para nossas vidas é encontrar a inocência e a seriedade ao planejar o futuro como quando éramos crianças, como diz Nietzsche “a maturidade do homem consiste em haver reencontrado a seriedade que tinha no jogo quando era criança”. Jogo da vida, seriedade em acreditar ser capaz de realizar os sonhos e as aventuras, como o menino que sonhou ser um grande pássaro e hoje é um exímio piloto.
Portanto, vá e/ou volte à universidade mesmo estando com mais de 40, 50, 60… faça aquela viagem com que tanto sonha, banhe-se naquela praia que tanto admira, escale um montanha, faça de seus sonhos uma realidade, pois, viver é antes de tudo sonhar e utopia é apenas uma seta apontando para os potenciais que existem dentro de nós.
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